Ah, o mercado financeiro, essa entidade mística que acompanha cada movimento do governo com um ceticismo quase religioso. A última edição do Boletim Focus trouxe uma previsão tão desalentadora quanto previsível: a taxa Selic em 2024 será a mesma que está em vigor agora, 10,50% ao ano. Em outras palavras, ninguém no Comitê de Política Monetária (Copom) está realmente disposto a mover um dedo para mudar algo. Aguardava-se ao menos um tom diferente no comunicado, mas no final, todos os nove diretores do Banco Central, inclusive os quatro escolhidos a dedo por Lula, votaram pela manutenção estática. Claro, reafirmaram o compromisso com o controle da inflação e ancoragem das “expectativas futuras”. Que inovador!
Enquanto isso, Lula, fiel ao seu estilo, tentou de tudo para influenciar a decisão de quarta-feira. Em entrevista a uma rádio, declarou que “o comportamento do Banco Central” era a única “coisa desajustada no Brasil nesse instante”. Chegou ao ponto de o PT anunciar uma ação judicial contra o presidente do BC, Roberto Campos Neto, por sua participação em um evento político e pela alta taxa de juros. Porque, claro, quando tudo mais falha, sempre há os tribunais. Ah, a lógica impecável: Campos Neto vai a um evento, então isso deve ser motivo de alta na Selic?
Campos Neto não decidiu isso sozinho, e o fato de mesmo os quatro diretores apadrinhados por Lula terem votado pela manutenção da taxa fala volumes sobre o real desajuste no país. A irresponsabilidade fiscal desenfreada do governo petista é que tem sido a verdadeira causadora da rápida deterioração das finances públicas e da desvalorização da moeda. Claro, é muito mais confortável para Lula apontar o dedo para o BC, enquanto três outros dedos apontam para si mesmo e sua farra de gastos.
Se despesas ilimitadas, aumentos salariais para o funcionalismo público, e tentativas desajeitadas de diferenciar “gastos” de “investimentos” fossem uma peça de teatro, estaríamos diante de uma tragicomédia. No entanto, não há riso no fato de que esses “investimentos” são apenas eufemismos para tirar dinheiro que o governo não possui.
Então, qual foi a mensagem clara do Copom? Em um parágrafo que praticamente grita bom senso, disseram: “Uma política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida contribui para a ancoragem das expectativas de inflação e para a redução dos prêmios de risco dos ativos financeiros, consequentemente impactando a política monetária.” Traduzindo: parem de gastar descontroladamente e talvez a inflação venha a se estabilizar.
Mas quem se preocupa com política fiscal crível quando se pode viver de retórica vazia e negação econômica? Lula e o PT não percebem, ou preferem não perceber, que juros são um sintoma, não a doença. A política monetária contracionista é apenas a consequência de desastres fiscais como os que têm sido cultivados. Governos gastadores desvalorizam suas moedas e enfraquecem suas economias, algo que mesmo os apadrinhados do presidente no BC parecem entender – pelo menos por enquanto.
A paz momentânea da manutenção dos 10,50% pode ser apenas isso: momentânea. O que o futuro reserva para um Banco Central cada vez mais preenchido por diretores indicados por um presidente com visões econômicas peculiarmente questionáveis? A especulação já começa: Gabriel Galípolo, o favorito de Lula para substituir Campos Neto em 2025, talvez tenha perdido terreno com os eventos desta semana.
Assim, segue nosso show político-econômico, onde a matemática, inevitavelmente, se recusa a ceder à ideologia. Lula pode continuar suas bravatas, mas dinheiro público não nasce em árvores, e a realidade, essa que desconhece ideologias, um dia vai cobrar a conta.