Por Marcos Paulo Candeloro
Há pouco mais de um ano, brotava uma série de artigos sobre o Medical Assistance in Dying (MAiD), um programa de suicídio assistido do Canadá, terra dos corajosos que ousam desafiar não apenas o frio, mas as convenções morais milenares. Originalmente, o MAiD seria um gesto de compaixão para aqueles em estágios terminais de doença, mas por que parar aí? Afinal, uma vez aberta a caixa de Pandora, por que não explorar todas as maravilhosidades que ela pode oferecer?
Agora, Parkinson, esclerose múltipla e, preste atenção — até a depressão e dificuldades financeiras — podem te colocar na fila para um “adeus assistido”. Madeline Li, uma psiquiatra de cuidados paliativos, uma entusiasta inicial do programa, confessa estar um pouco desconfortável com essa liberalidade toda. “Era confortável quando era só para os moribundos”, diz ela. Oh, os velhos bons tempos, lembram?
Avançando nesta espiral de liberdade, abril, o mês de conscientização sobre o autismo, nos presenteou com um marco judicial: uma jovem autista recebeu sinal verde para o MAiD. Não há grandes impedimentos físicos aqui, apenas o diagnóstico de autismo e TDAH. Mas quem somos nós para julgar o que constitui sofrimento suficiente para querer sair de cena?
O pai desta jovem, conhecido como “W.V.”, obviamente perdido no que deve parecer um episódio de “Black Mirror”, tentou desafiar a decisão. Ah, o amor paternal! Mas a balança da justiça não se inclinou a seu favor – dois médicos a favor, um contra, e o juiz Colin Feasby decretando que a vontade da jovem de morrer deveria prevalecer.
Ah, a autonomia! Que conceito maravilhoso. M.V., a jovem em questão, tem o direito de escolher entre viver ou morrer com dignidade, segundo o juiz Feasby. E claro, o que poderia ser mais digno do que escolher o momento de sua última cortina?
E aí temos: a substituição completa da velha ética cristã (toda vida é sagrada) por uma ética mais moderna, flexível e, claro, secular. Qualidade de vida contra sofrimento desnecessário — quem decidirá o que é desnecessário ao fim? A relativização da vida segue um curso perigoso, mas ei, estamos na fronteira da liberdade individual, e o Canadá, sempre à frente, nos mostra como é estar na vanguarda das decisões mais sombrias disfarçadas de autonomia.
Deixamos então aberta a reflexão: até onde estamos dispostos a ir nessa jornada de auto-derterminação? E lembrem-se, a caixa de Pandora está aberta, e repleta de liberdades que nunca sonhamos possíveis – sejam elas maldição ou benção, ainda está para se ver.